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Política na arquibancada: como as torcidas do Marrocos usam os jogos de futebol para expressar suas insatisfações

Por PATRICIA em 10/12/2022 às 01:39:14

Os estádios são lugares onde os marroquinos ainda podem se expressar livremente. As organizadas têm músicas como 'No meu país eu sou injustiçado' e 'Livre e Rebelde'. Torcedores do Raja Casablanca cantam contra o governo

O Marrocos, que neste sábado (10) disputa um jogo das quartas-de-final da Copa contra Portugal, tem uma cultura de torcidas com uma peculiaridade: as organizadas são muito politizadas e fazem críticas ao Estado e campanhas.

Apesar de serem relativamente recentes, as torcidas organizadas dos clubes são muito presentes nos estádios, um dos locais onde ainda há certa liberdade de expressão no país, de acordo com um artigo do pesquisador britânico Christopher Cox, da Universidade de Exeter.

Entre os cantos politizados das organizadas, se destacam os seguintes:

Uma canção da organizada do Raja Casablanca virou um hit nos estádios. O título é “No meu país eu sou injustiçado”. A letra ataca os corruptos por acabarem com as oportunidades econômicas dos jovens no Marrocos.

Uma organizada do Wydad, um outro time de Casablanca, tem uma música chamada “Livre e rebelde”; a letra fala do desemprego entre os jovens e de corrupção.

Os torcedores do Kenitra tem um grito contra a polícia e contra o governo: “De suas injustiças estamos fartos, nós odiamos todos vocês”, eles cantam.

Torcedores marroquinos em Casablanca, em 6 de dezembro de 2022

Abdelhak Balhaki/Reuters

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Os adversários do time do rei

As maiores organizadas são a dos times Raja Casablanca e Wydad. Os dois são de Casablanca, e os dois têm como rival um outro time, o ASFAR, o “time do rei”. Foi um clube criado pelo rei Hassan II. O nome completo é Clube Associação Esportiva das Forças Armadas Reais. Para os rivais, é um time que recebeu favores e contratos do Estado, especialmente nos anos 1960, 1970 e 1980.

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Nos estádios também há muita iconografia da família real.

Por isso, faz sentido que as torcidas adversárias do time do rei se voltem contra a monarquia, por exemplo.

A história das organizadas no país

No Marrocos, as primeiras organizadas surgiram por volta de 2005, e rapidamente surgiram grupos desse tipo para todos os grandes times marroquinos.

Em 2011 houve ondas de protestos em diversos países de língua árabe, inclusive no Marrocos. Foi a chamada Primavera Árabe.

Inicialmente, a elite política marroquina sinalizou que iria conceder algum tipo de abertura, mas depois foram baixadas medidas repressivas para controlar o ativismo na internet e as manifestações de rua.

Os estádios, no entanto, ainda são um espaço de liberdade de expressão. Além das músicas, as torcidas têm um histórico de campanhas no país:

Em 2018, houve um incidente no país: Hayat Belkacem, uma estudante de 19 anos morreu ao tentar atravessar a fronteira para um enclave espanhol no território marroquino. A torcida do Moghreb Tetouan começou a cantar que iria se vingar da morte de Hayat, vaiou o hino do país e criticou os policiais nos estádios;

Organizadas de vários times passaram a cantar a música composta pelos torcedores do Tetouan depois desse incidente com Hayat;

Depois de crimes de violência sexual em estádios em 2018, a torcida do Raja Casablanca fez campanhas para tornar os estádios mais seguros para as mulheres.

A resposta do governo

Na mídia estatal, as organizadas são estigmatizadas como violentas. Nos estádios, a polícia já reagiu de forma agressiva. No entanto, o governo marroquino tem dificuldade de interferir na politização das torcidas.

Em 2016, houve uma tentativa de proibir as organizadas depois de uma briga em que três pessoas foram mortas.

A tentativa de proibição desatou uma união entre as torcidas, que fizeram campanhas e manifestações em conjunto.

Em 2018, o governo desistiu da proibição.

Fonte: G1

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